A imaginação estreita do constituinte de 88, consumida pelo sonho boomer, fez do Brasil um museu a céu aberto, terrivelmente preso aos anos 60 e 70. Tudo pra gente remete ao duelo Arena x MDB, ditadura x esquerda. A linguagem, a estética, as premissas, as categorias, são todas oriundas daquela época; os filmes que vão ao Oscar, as canções insuportáveis de MPB (cantadas até hoje pelo Ministro Barroso em eventos diversos), o duelo Lula x Bolsonaro, o asilo de Jean Wyllys, os juristas que se acham heróis, a nostalgia de uma “era de ouro” que se foi. Curiosamente, esquerda e direita evocam o período como tempo sagrado, momento fundacional. O problema é que esta merda já passou pro resto do mundo. Foi superada. Mas ficou aqui, como carros velhos ficaram em Cuba. Não vamos reformar o estado com essa imaginação; não vamos destruir o crime organizado; não vamos produzir música original; não vamos fazer cinema decente; não vamos produzir cidades bonitas; não vamos eliminar favelas nem educar nossos jovens. Essa merda é uma doença burra das elites. Uma chaga cultural que persiste. E o pior: não será com a gororoba de massas gestada no caldeirão neopentecostal goiano-marçalista, pontilhada de dentes de mentex, pistache e doenças venéreas da Virgínia que vai brotar uma resposta. Isso é apenas o corpo em febre. Precisamos de um novo horizonte de elite. De uma criação por parte dos melhores. Isso é mais difícil do que ser popular — até porque a direita é popular, mas isso nada significa na hora de imaginar. Por mais que seja otimista, não vejo sinais de uma melhora nesse sentido. É tudo incipiente. Isso significa que as mudanças terão que vir a contragosto da elite, e não como parte de um consenso geral. Será osso.